sexta-feira, 29 de março de 2013

A Cidade Velha de Marrakech



Na minha opinião as palavras que melhor definem a cidade antiga de Marrakech serão azafama e  indecifrável. No momento em que o avião aterrou, já se via uma nuvem vermelha de poeira no horizonte de final de tarde. O céu era de um azul claro mas ao mesmo tempo escuro, indefinido. Depois de passar o controle de passaporte – que foi bastante rápido e despreocupado, seguiu-se uma curta aventura, que embora tenha sido em poucos dias, me recordo de cada minuto detalhadamente - talvez por ter sido tão único e o meu primeiro contacto com a África do norte, que sem dúvida foi inesquecível.





Desde a barganha constante com o taxista para nos levar ao centro, à que se seguiu nos dias seguintes para tudo e mais alguma coisa menos para comer em restaurantes, foi uma variante constante durante toda a viagem até voltarmos novamente para aeroporto. Nestes dias apesar de a comunicação em inglês ser razoavelmente fácil, o uso de francês esteve também sempre presente – sobretudo nos momentos de sobressalto.

Ficamos alojados no centro do Souk, no Riad Karmela, com cortinas de algodão que esvoaçavam com o pouco vento que havia, com adornos árabes em todas as salas e quartos, a típica arquitetura, as flores e cheiros que nos maravilhavam... Fomos recebidos com chá de menta, que sempre me perguntei o porquê ou a sensação que traria, beber um chá num dia abafado de Julho com 40 ºC - e eu não estou habituada a beber mate argentino ou brasileiro mas suponho que a sensação seja similar.



Quando finalmente chegamos ao centro da cidade, vindos do aeroporto, vimo-nos inseridos num mar de gente célere, bracejadora e curiosa. Senti muitos cheiros diferentes, muitos sons diferentes: os motores dos automóveis e lambretas, as buzinas, cada um num sentido diferente, pessoas misturadas no meio das estradas com todo este trânsito, flautas, vendedores... e de repente, quando nos deixamos de distrair por este cenário único, vimos que um senhor que parecia ter 70 anos, já levava as nossas malas pelo meio da multidão, num carrinho de mão improvisado de diversos objetos. Em 3 segundos demos uma nota inteira ao taxista e fomos a correr atrás deste senhor que levava as nossas malas, de uma forma bastante organizada e confiante, pelo meio de uma multidão tudo menos organizada ou privada. 

O francês dele era um pouco incompreensível para mim, mas não me posso queixar, entendi tudo o que tínhamos de entender. Então em 15 minutos vimos Marrakech como se fossem os últimos 15 minutos das nossas vidas e em que todas as imagens importantes nos enchem a cabeça. Foi assim. Muitas cores: vermelho, amarelo; muitas vozes, muita gente, muitas especiarias no ar, gasolina, ouro, bijus, tapetes, olarias exóticas, pulseiras, tintas, animais: macacos, camelos, cobras, tudo e todos em perfeita harmonia no meio de vendedores, cicerones, turistas, nós e o senhor de 70 anos que nos levava as malas no seu carrinho de mão. Tinha achado que poderíamos estar a fazer este caminho desde o táxi até ao Riad sozinhos – mas depois vi que era totalmente impossível: para mim o Souk foi, até hoje, a mais perfeita definição real de labirinto.




Finalmente chegamos. “Chegamos ao Riad” diz o nosso silencioso transportador. Pagamos o acordado – que não me recordo de quanto foi, pois era tão pouco e eu ainda estava demasiado distraída e atónita. Sentia-me de verdade, num lugar que não conhecia e que não poderia comparar com outra cidade onde já haveria estado. Senti-me insegura também quando vi que havia uma rua longa e estreita onde se encontrava no meio a porta do nosso Riad - o que seria uma assustadora ruela em Lisboa, Paris, Madrid ou Londres... Passado mais umas horas entendi que todo o Souk era assim e isso afastou os meus receios. Entramos e de repente, assim instantaneamente, no momento em que fechamos as portas, só havia o silêncio e a água a correr de um lago interior que o Riad possuía no seu pátio comum. Fomos atendidos com toda a serventia e simpatia, mais do que em muitos outros mais organizados sítios carecemos de ser. E foi aqui que veio o nosso chá de menta a ferver, e relaxamos imediatamente. Nunca tinha sentido tantas emoções e sensações em tão pouco tempo, uns 30 minutos – e basicamente toda a visita a Marrakech foi assim.


Acho que o meu conselho mais importante vem aqui: ficando num souk, de qualquer outra cidade, acho que é importante que o hotel seja pelo menos muito bom. Teria voltado esgotada desta viagem se o nosso Riad não fosse este harém de tranquilidade. Os finais de tarde e os pequenos almoços eram o nosso recarregar de baterias de toda aquela pressa que estava fora das muito altas paredes vermelhas.



Ficamos pouco tempo, então não tivemos tempo de visitar o deserto nem as famosas praias de Agadir – tenciono voltar a Marrocos, assim que acho que deixarei essa viagem para outra altura. Para quem o deseja fazer, uma semana ou no mínimo 5 dias é o necessário para aproveitar exaustivamente cada ponto de passagem: Marrakech, o deserto e as praias.





Nos dias e noites que se seguiram, exploramos a cidade, visitamos a medina, restaurantes, casas nobres que estavam abertas ao público, tivemos a nossa dose de barganha e compras e descansamos no Riad. Penso que Marraquexe é um grande mercado onde de verdade se pode encontrar tudo – desde sapatos da Zara falsificados, relógios, todo o tipo de comida, roupas e tapetes demasiado bonitos "para só olhar". Não estávamos a viajar com grande bagagem assim que me foi bastante doloroso pensar que não podia levar um desses tapetes comigo.







O calor é sem duvida destruidor, e misturado com todos aqueles odores tão particulares e diferentes, descansar e parar a meio do dia umas 2 horas é imperativo. Os restaurantes seguiam o mesmo estilo do nosso Riad: Tranquilos, florais, silenciosos. O único som que poderia ser mais elevado e trespassar as altas paredes das casas era sem dúvida a chamada muçulmana para oração.

O que mais me marcou nesta viagem foi sem dúvida o choque que sentíamos diariamente desta confusão e desorganização nas ruas em contraste com a calma e rigor dentro dos restaurantes, cafés e hotéis  O valor e o apreço que atribuímos ao silêncio, a uma refeição tranquila e ao descanso aqui parecia ser maior e mais merecido. Depois toda a cidade é bastante enigmática. Desde os gatos em cada esquina aos seus olhares curiosos, tal e qual como os olhares dos seus habitantes, às estreitas ruas vazias de tom terra-cota aos sons e as músicas em cada esquina.



Finalizamos a nossa viagem com um jantar num dos muitos disponíveis típicos restaurantes de Marrakech. Mais tarde verifiquei e não encontrei um feedback online tão positivo como achava que iria encontrar – de qualquer das formas para nós foi excelente. Fomos jantar ao Le fondouk ao lado da Medina, integrado no meio do Souk. Fomos para o terraço no alto de uns 5 ou 4 andares que o restaurante parecia ter. Fomos recebidos muito atenciosamente, com um staff fluente em inglês e ritualmente lavamos as mãos nuns clássicos potes que nos trouxeram à mesa. O menu vinha enrolado como se fosse um papiro,  e escolhemos dois pratos típicos de cordeiro, que tirando o que a minha querida avó prepara, este deve ter sido um dos melhores que comi até hoje! O ambiente era envolvente, carregado de pequenas rosas vermelhas em todos os lugares, jantamos à luz de velas, e pouca luz eléctrica havia neste pátio comum – fiquei com a impressão que havia velas por todo o lado e só mais as estrelas no céu para nos iluminar.  Ouvia-se a chamada para a oração no ar... todo este  ambiente e mistério, fez-me sentir estática no tempo, penso que foi um daqueles momentos eternos que vivemos nas nossas vidas e nunca nos esquecemos. Havia pessoas de várias idades, e por momentos fiquei com receio, achei que este jantar fosse dar uma soma demasiado alta para o nosso bolso de jovens viajantes – no final correu tudo bem, bastante em conta, resultando nuns 40 euros no total para dois, para um jantar de 3 pratos.



E assim partimos de Marrakech.. no momento em que fomos, fiquei na dúvida se queria voltar ou não para aquela confusão. Mas o tempo respondeu-me que sim, e estou com saudades de Marrakech. Senti secretamente quando lá estive que iria voltar, só não sei quando, com tempo para fazer outras coisas e visitar outros lugares que não só a cidade antiga. Adorei e sem dúvida que vale muito a pena visitar.



sábado, 16 de março de 2013

Sincerely Yours, Budapest




 
 
 
I don't have enough words to show how I feel for a city and a country that welcomed me as its inhabitant for more than 2 years. I will rather consider these words as a start of many others to be followed, about its food, its people, its places and its traditions.








For me Budapest is not always yellow - quoting Chico Buarque, Brazilian singer and writer in his book Budapest. In my perception this city has two colors. In the summer is yellow, and in winter is gray or raw. The sky is silver, with the sun always hidden, reflecting this color on the Danube and across the city. In the summer morning or sunsets even the buildings themselves have such a yellow crisp tone as Chico mentioned on his book.

 

Budapest is my Paris, my city of love. Several areas of the city, if not all, can be a beautiful postcard or a perfect backdrop for any photograph or film. Budapest is extremely keen in the art of camouflage, we easily see it passing as Paris or Moscow.
In its short summer, this city is extremely hot, as hot as a southern city in Latin America in their summers. It's hard to find trees along the streets, trees that provide at least a fair shadow to its diurnal inhabitants. But there is always the option of finding a hiding place on Margarit Island, in Varos Liget, in Erszebet Tér among other places. Here in summer there is a tradition of going on improvised picnics. Often people plan these gathers after work or during their weekend, taking their own drinks and food, joining friends in a sunny day in the park. You can eat raw paprikas, impressively tasty burgers and super chilled beers.

 
Besides the long winter - like other countries in the region - there is something that I value a lot in this city and in Hungary in general: the seasons are extremely well defined. Here a photography project is very rewarding because the landscape changes significantly every 3 months. You can see the snow sleeping on the roofs or the green spring shoots in the beautiful trees of Andrassy. Among the trees in full summer canopy to leaves of yellow and orange tones in autumn. For me this is a very particular sight, as were I come from Autumn and Spring are too short and we never see snow.
All cities, especially European ones, have a thick book of history that marked them, either physically or culturally, but here everything seems to have happened about 5 years ago. The scars left by the various wars and conflicts are still present in buildings, and in most cases is deliberate - perhaps to never forget? Maybe. It is also interesting to remember that the holidays in Hungary are often a memorandum of historic lost battles, and the human loss it brought - and year after year the scar is marked on the face of this charming woman called Hungary and its gorgeous daughter Budapest.

 

 It is a city that I consider unique and I will always remember it as my second home "of my younger years." The Danube is so often mentioned in songs, films or people's names, that when I got to know him personally I finally understood all the charm that covered him. A storyful river that unites countries and cities so unique and beautiful. Being Budapest, for me, his precious pearl. To understand this view, you have to go to Vigadó tér and just admire the landscape, either at night or day, of the Chain Brigde, the hilltop castle, the Fishermen's Bastion, the boats passing by ... - It is a truly unique mirage. The photos are not realistic enough. You must be included in this picture, to feel and realize of its greatness and the feelings it gives you.

                                   





Finally, what I like most in Budapest is the ease with which we can go anywhere, either by public transportation or by car, the extensive cultural offerings and its accessibility. The ease with which in the same week you can go to the opera, the theater, a club or a more refined "romkocsma" - without bankrupting.On the famous Budapest nights the most typical corners are undoubtedly the "ruin pubs" or in Hungarian the "romkocsma", where it is worth mentioning Szimpla, Grandio, Ankert among many others. One only need to walk in the streets of the District VI and VII and watch the bars that lend themselves ahead. The offer is grand, creative and surprising.
 

 

This is my first impression of a city that I call mine. A city where I always feel at home when I return. I'll have to devote some extra time to talk about the Hungarian people, equally friendly and private - for having a Hungarian friend it's a tasty treat that only a few can afford to have.

sexta-feira, 15 de março de 2013

Budapeste



Não são suficientes um par de palavras para demonstrar o que sentimos por uma cidade e um país que nos acolheu como sua habitante por mais de 2 anos. Mas considerarei estas palavras como um início de muitas outras que se seguirão, sobre as suas comidas, o seu povo, os seus lugares e as suas tradições.

Para mim Budapeste não é sempre amarela – como dizia Chico Buarque, cantor e escritor brasileiro no seu livro Budapeste. Na minha percepção esta cidade têm duas cores. No verão é amarelada, e no inverno é cinzenta ou cru. O céu fica prateado, com o sol sempre escondido,  refletindo-se esta cor no Danúbio e em toda a cidade.  No Verão, as manhãs, os entardeceres e até os próprios edifícios possuem o tal tom torrado que Chico falava.









Budapeste para mim é a minha Paris, a minha cidade do amor. Várias zonas da cidade, para não dizer quase todas, se enquadram num bonito postal ou são cenário perfeito para qualquer fotografia ou filme, sendo Budapeste profissional na arte de camuflagem, passando facilmente por uma Paris ou Moscovo.

No seu curto verão, esta cidade é extremamente quente, tão quente como uma cidade do sul da América Latina nos seus verões.  É difícil encontrar árvores pelas ruas, pelo menos árvores que proporcionem uma sombra justa aos  seus habitantes diurnos. Mas há sempre a opção de encontrar um esconderijo na Ilha Margarida, no parque da cidade, na Erszebet Tér entre outros locais. Aqui no Verão é rotineiro levar as suas bebidas e comidas, juntando-se num solarengo fim-de-semana no parque, como de um piquenique volante e improvisado se tratasse. Comem-se paprikas cruas, hamburguers grandiosamente saborosos e bebem-se cervejas bem geladas.


Apesar de o Inverno ser longo – tal como os outros países da região – há algo que valorizo muito nesta cidade e na Hungria no geral: as Estações extremamente bem definidas. Aqui um projeto de fotografia é bastante compensador pois a paisagem modifica-se significativamente.  Entre a neve adormecida nos telhados aos rebentos verdes nas bonitas árvores da Andrassy. Entre  as árvores de copa cheia no Verão às de folhas amareladas e laranja do Outono.


Todas as cidades, sobretudo as europeias, possuem um grosso livro de histórias que as marcaram quer física ou culturalmente, mas aqui tudo parece ter acontecido há uns 5 anos atrás. As cicatrizes deixadas pelas várias guerras e conflitos estão ainda presentes nos edifícios, e na maior parte das vezes é de propositado – talvez para nunca esquecer? Talvez. Também é curioso relembrar que os dias festivos da Hungria são muitas vezes memorandos de batalhas em guerras anteriores, e a perda humana que trouxeram – e ano após ano a cicatriz é marcada na cara desta charmosa Mulher que é a Hungria e a sua esplêndida filha Budapeste.

É uma cidade que eu considero única e penso que para sempre será a minha segunda casa “dos meus tempos de juventude”. O Danúbio é tantas vezes mencionado em canções, filmes ou nomes de pessoas que quando o conheci pessoalmente entendi todo o encanto que o envolvia. Um rio que une países e cidades igualmente únicas e bonitas. Sendo Budapeste, para mim, a sua pérola preciosa. Para entender esta visão, estar em  Vigadó tér ajuda a tirar todas as dúvidas. Basta admirar toda a paisagem, quer noturna ou diurna, da ponte das correntes, o castelo no cimo da colina, o bastião dos pescadores, os barcos que por ali passam... – é uma miragem verdadeira e única. As fotografias não lhe fazem justiça. É necessário estar incluído neste cenário, sentir e perceber a grande dimensão que ele têm e os sentimentos que nos transmite.






Por fim, o que eu mais gosto em Budapeste é a facilidade com que conseguimos chegar a qualquer lado, quer de transportes públicos ou de carro. A extensa oferta cultural e a sua acessibilidade.  A facilidade com que na mesma semana se pode ir à Opera, ao Teatro, a um Club mais requintado ou a um "romkocsma" – sem empobrecer a conta bancária. 
Nas noites de Budapeste o mais típico são sem dúvida os “ruin pubs” ou em húngaro “romkocsma”, onde vale mencionar desde o turístico Szimpla, Grandio, Ankert entre muitos outros. Basta apenas caminhar pelas ruas do distrito VI e VII e prestar atenção aos bares que se prestam pela frente. A  oferta é grandiosa, criativa e surpreendedora. 

Fica esta minha primeira impressão sobre uma cidade que chamo minha, e pela qual me sinto sempre em casa quando volto. Terei de dedicar algum tempo para falar sobre o povo húngaro, igualmente acolhedor e particular – pois ter amigos húngaros é um saboroso capricho que só alguns se podem dar ao luxo de ter.